Quando no início do ano vos falei de novidades para a Conversa Entre Autores não estava a brincar. E aqui está a primeira: ao longo deste primeiro semestre pretendo dar-vos a conhecer alguns dos autores com quem mais tenho contacto e que me ajudaram igualmente na versão 1.0 da rubrica. Posto isto, a entrevista de hoje diz respeito à autora Lauren Lewis. Esta autora portuguesa, e que assina com um pseudónimo, irá publicar o seu primeiro livro (e dividido em duas partes) com a minha editora, a Cordel d´Prata. Desta forma, e não roubando mais a atenção que quero dar a esta nova autora, segue-se a entrevista que tive com ela no passado dia 19 de fevereiro. Não esperem por algo curto. É uma entrevista diferente, completa e que vos deixará apaixonados pela história, garanto-vos!

D.: Lauren, conhecemo-nos há já algum tempo neste mundo e ambos vamos dando os passos nesta longa jornada. Queres apresentar-te para os que nos leem?
L.: Olá, Diogo! Obrigada pela oportunidade!
Defino-me como uma pessoa obstinada, insegura e dedicada…. Aspirante a romancista com “A” grande.
D.: Agora partindo para o teu primeiro livro a ser publicado este mês… Há muito, muito mais trabalho que é feito na escrita e os leitores não veem! Podes falar-me um bocadinho do trabalho de preparação para este livro?
L.: A noção que temos do trabalho que incutimos num livro é, muitas vezes, ofuscada pela entrega, pela dedicação e pela vontade de contar a história. Sei que tive trabalho, nada se faz sem se trabalhar muito, mas prefiro olhar para a preparação deste livro como algo que me ultrapassou por completo. Digo muitas vezes que estive vinte anos a preparar-me para o escrever: li muito. Li mais do que possa ser possível. Sou uma pessoa insegura e talvez a leitura de outros autores tenha sido a minha grande preparação para escrever esta história.
D.: É seguro deduzir Black Heart como o teu primeiro livro ou já escreveste outras coisas antes?
L: Quando comecei a escrever BLACK HEART tinha acabado de escrever uma história que intitulei como “A última dança”. Estava a pensar se lhe dava uma continuação ou se mantinha o final que escolhi. Abandonei essa história por completo e nos treze meses seguintes não pensei em mais nada a não ser em BH.

D: Black Heart parece-me uma história bastante poderosa, com temas preocupantes da sociedade contemporânea: porquê abordá-los? O que te fez escolhê-los como esqueleto da história?
L: O motivo é pessoal. Lidar de perto com um suicida foi, sem dúvida, um dos piores momentos da minha vida enquanto pessoa. Chega a uma altura em que as palavras ou não são ouvidas ou são muito dolorosas de se ouvir. No suicídio, não há meio termo. Escrever uma história sobre este tema é, também, dar voz a todas as pessoas que ficam, ainda e apesar de tudo. Não é fácil. Nem sei se algum dia será fácil estar lado a lado com um suicida e não sabermos quanto tempo ainda vamos ter para o amarrar ao nosso lado, por baixo do nosso olhar. Há uma altura da jornada em que somos realmente as pessoas mais egoístas do mundo, porque queremos manter vivo alguém que já desistiu de viver. Foi esta a minha premissa quando comecei a escrever BH. Queria ser ouvida, mas mais do que isso, queria mostrar a um suicida que é possível reaprender a viver. E é. Tenho a certeza de que é possível voltar a viver depois da perda, depois da dor, depois da quase-morte. Escrevi para um suicida (que denomino ternamente como BLACK HEART), porque acredito que as palavras e o amor são as armas mais poderosas da sociedade, as únicas capazes de enfrentar um dos maiores pesadelos: o suicídio.
D.: É por esta razão que a história está divida em duas partes? Achas que as temáticas contribuíram para uma narrativa verdadeiramente profunda?
L.: Não sei se o facto de a história ser longa se deve à narrativa ou a quem a escreveu (risos). É possível que aquilo que quero mostrar não possa ser empacotado em apenas trezentas páginas. Há todo um percurso que espero que os leitores percorram com as personagens, um trilho que eu própria fiz enquanto leitora. Ninguém se cura de uma doença do foro psíquico com a descoberta do amor. Essa ideia é demasiado fantasiosa para que eu me aproveitasse dela. Além disso, quis mais, muito mais do que simplesmente dar um “felizes para sempre” a uma história que tinha tudo para acabar mal. Em primeiro, quero que as pessoas conheçam estas personagens, saibam quem são, sobretudo que os entendam. O resto… é um domínio onde eu, enquanto autora, não quero entrar, nem posso. É a interpretação de cada leitor. O que posso dizer, porque é verdade, é que há muito amor nesta história e quando as pessoas estão apaixonadas demonstram-no, vivem-no intensamente.
D.: Com estas perguntas, o que podemos esperar desta narrativa?
L.: Um livro para viver, para sentir, para rir e para chorar. É um romance no qual o maior ingrediente não podia deixar de ser o “amor” – do mais verdadeiro que possa existir.
D.: E foi-te difícil? O que é que foste sentido enquanto escritora à medida que ias delineado a história?
L.: Não posso classificar a escrita de BH como “difícil”. Houve alturas em que senti que nunca ia conseguir terminar a história, em que senti que não ia dar em nada, mas em compensação foi uma aventura que jamais esquecerei. Eu não sei escrever se não for para me entregar de corpo e alma ao que estou a escrever. É como se vivesse num mundo à parte, estou aqui, mas apenas fisicamente. Mesmo que não esteja a escrever, não me solto da história. As minhas melhores ideias não foram encontradas diante do computador, mas a viver a vida da pessoa que não escreve.
É engraçado que ainda hoje, quase um ano depois de terminar todos os volumes, consigo sentir a história em tantas coisas, por exemplo em músicas. Quando vou a conduzir e começam a tocar determinadas músicas, volto a viver episódios que foram escritos ao som daquelas músicas. É assustador! Começo a lembrar-me de certas coisas que aconteceram na história. É como se a música me puxasse de volta para o momento em que estava a escrever. De facto, isto da imaginação e do poder da escrita ainda é para mim muito envolto em magia.
D.: E o que sentiste enquanto leitora ao ler os diversos rascunhos do manuscrito? Que receios tiveste?
L.: BLACK HEART – I foi reescrito quatro vezes. Guardei todas as versões. Tenho tudo guardado por datas e é assustador abrir aqueles documentos, porque nunca pensei chegar a isto que agora apresento. Se dissesse o contrário, estaria a mentir. A ideia não era má, quando comecei, mas era fraca. O tema e os nomes das personagens são as únicas marcas que provam que há uma ligação entre a primeira tentativa e o resultado final.
Na verdade, quando comecei a escrever a história, comecei-a na perspetiva do protagonista, o Matthew. Escrevi os primeiros capítulos e depois fui escrever a versão da Anna. E não mais parei até a terminar. Não sei se me identifiquei com ela, mas sei que foi-me mais fácil escrever como Anna do que como Matthew, porque nos olhos da minha protagonista é tudo muito mais esperançoso, feliz, genuíno, porque é isto que ela é.
A primeira vez que abri o documento da versão do Matt, já muito depois de ter terminado a história na versão da Anna, apanhei um choque, realmente um grande choque: só pensava “eu conheço isto”, “eu sei quem é esta pessoa”, “ela vai fazer aquilo… ele é importante por isto”. Foi muito surpreendente ver a história por outro prisma, começar de novo, mas aos olhos do Matt. É nessa versão que tenho trabalhado muito. O futuro da versão do Matt é um mistério até para mim, não sei se verá a luz do sol, mas sei que é importante para mim e para algumas pessoas que eu a termine, pelo menos o primeiro volume.

D.: Qual foi a personagem que mais gostaste de construir e aquela que de quem mais sentes saudades?
L.: Sob o risco de soar cliché, não tenho personagens preferidas, nem gosto mais de umas do que de outras. As minhas personagens são as personagens que eu escolhi, as personagens que eu imaginei e as que eu transportei para o papel. Gosto verdadeiramente de todas. São amigos para o resto da minha vida, independentemente de outras pessoas virem a considerá-los assim ou não. E sinto saudades de todas, por isso ando sempre a saltitar de história em história, a reler, a falar sobre eles com pessoas que realmente entendem o quão estranho isto é. Para minha sorte, tenho quem alinhe nas minhas aventuras literárias. Desde que comecei a tal primeira história que nunca mais parei de querer inventar pessoas novas e dar-lhes vida através das palavras.
D.: Alguma das personagens são baseadas em pessoas que conheces?
L.: Vou deixar que os meus amigos se procurem (risos).
É provável que haja particularidades e características que fui buscar a pessoas que conheço, mas na generalidade é tudo produto da minha imaginação.
D.: O final que escreveste foi aquele que sempre planeaste? Quando começas a escrever, tens sempre o final delineado ou manténs algumas possibilidades que dependem, por vezes imprevisível, do desenrolar da história?
L.: Quando começo a escrever nunca sei para onde vou, nem para onde quero ir, apenas tenho as personagens mais ou menos delineadas (pelo menos os seus nomes) e o tema que quero abordar. As minhas histórias falam sempre de temas sobre os quais, aparentemente, não se escrevem histórias de amor. Posso adiantar que Hideaway, outra saga já terminada, fala sobre traumas de guerra e orfandade. Mas em momento algum defino o final. Deixo-me ir. Pode correr mal? Pode. Ensinam-nos na escola a planificar os textos, mas eu tenho o gosto de contornar todas as regras que conheço. Escrevo como se nada mais existisse, vivo as personagens e as suas histórias até ao fim, até reconhecer que “acabou”. Até lá chegar, tenho liberdade. É disso que eu gosto quando escrevo: liberdade para escrever como quero e como bem entendo. Sei que isto é um pouco egocêntrico, mas também é verdadeiro. Nada do que escrevo é forçado. Tudo o que escrevo é o que quero escrever. As histórias que invento são as histórias que eu quis escrever. Não sei se isto acontece com todos os que escrevem, mas eu tenho a sorte de não ter medo das palavras.
D.: Sempre ansiei por fazer esta pergunta a alguém, pelo que aqui vai: mudavas alguma coisa na história das personagens ou estás feliz com as decisões que elas, tu, tomaram?
L.: Sou muito feliz com as personagens que inventei, com as histórias que escrevi. Não gosto de pensar em “mudar”, isso significa alterar aquilo que vivi enquanto escrevia. Isto não quer dizer que eu não seja suficientemente racional para admitir que se fizesse sentido mudar alguma coisa na história (sem ser os nomes das personagens ou os temas) que não o faria. Tudo é uma questão de princípios e o meu é dar o melhor às minhas histórias, se durante a pré-edição surgir uma oportunidade de tornar a história ainda melhor, penso nisso, mas não faço disso uma obrigação ou preocupação constante.
D: Eu sou da opinião de que qualquer produtor de arte tem sempre receio de um certo tipo de pergunta que possa surgir por parte de quem a interpreta. Concordas? Tens alguma pergunta que achas que poderá advir desta história?
L.: Não tenho medo de perguntas, tenho medo de não ter resposta.
Embora o livro esteja em fase de pré-venda neste momento, esta história está escrita desde 2017 e já foi lida por um conjunto razoável de leitores (e amigos), creio que as perguntas mais óbvias já me foram feitas, mas espero surpreender-me muito com as que ainda hão de vir.
D.: Como classificas esta história na tua vida? O que é que ela te deu enquanto pessoa?
L.: BLACK HEART deu-me o que provavelmente nenhuma formação académica me poderia dar: a certeza de que quero fazer isto até que a minha mente seja capaz de compor histórias. É libertador conseguir dizer que quero ser romancista. É olhar-me ao espelho e ver isso sem culpas, sem me envergonhar por isso.
D.: E enquanto escritora?
L.: Aprendi que uma história não se escreve num dia, nem em dois, nem numa semana. Aliás, uma história é uma semente que precisa de muita água, de muito amor e de muita luz para dar flor. É difícil escrever um livro, porque exige disciplina, trabalho constante, organização (que não tenho!) e uma certa capacidade de abstração do mundo. É preciso deixar muitas coisas para “depois” ou “para nunca”. É importante ter uma boa estrutura emocional, mas sobretudo pessoas fora deste mundo que nos lembrem que não estamos sozinhos. Pessoas que entendam, que esperem, que saibam respeitar o nosso espaço e o nosso tempo. Sem tudo isto, acredito que é quase impossível escrever um livro. Para mergulharmos na história tem que haver tempo, predisposição emocional e psicológica. Se a nossa vida fora da escrita não estiver “arrumada”, pode ser um impedimento ou, pelo contrário, uma razão. Já escrevi com a vida desarrumada e com a vida arrumada, portanto sei o quão melhor é termos alguém à nossa espera quando regressamos, mais que não seja para nos colocar a par das notícias (risos).

D.: Alguém pergunta-te: “o que posso encontrar nestas páginas?”; qual a tua resposta?
L.: O melhor que eu fui capaz de escrever.
D.: O que te vai na alma quanto te perguntam como é ser escritora em Portugal?
L.: Prefiro não responder, caso contrário posso dizer alguma coisa que seja mal interpretado. Toda a gente sabe o que Camões dizia sobre as artes e as letras. Então… nada mudou. Mas também reconheço que estou a dar os meus passos agora, pode ser que eu consiga mudar qualquer coisa neste jardim de escritores.
D.: É essa resposta que está relacionada com o porquê de escreveres sobre um pseudónimo?
L.: Não. O uso do pseudónimo tem razões pessoais e profissionais. As minhas aspirações literárias estão para lá das fronteiras do nosso país.
D.: Porquê Lauren? Alguma inspiração secreta?
L.: Prometo que um dia explico, mas esse dia não será hoje.
D.: Agora vamos a algo mais rápido para todos te conhecerem. Preparada para umas respostas rápidas e curtas?
Sítio favorito para escrever?
L.: Junto a uma janela para ver o sol ou a noite.
D.: Melhor hora para escrever?
L.: Depois da 1h da manhã nos dias de verão. Adoro as madrugadas, o silêncio da noite e a certeza de que o sol voltará a brilhar no dia seguinte. Isto é um contrassenso, porque prefiro o inverno, a chuva e a neve!
D.: Escrever com música, ou sem?
L.: Sempre com música.
D.: Livro favorito?
L.: Dois. O Monte dos Vendavais da Emily Brönte e Longe da Multidão de Thomas Hardy. Costumo dizer que estou no monte dos vendavais, bem longe da multidão endoidecida. Além disso, a minha primeira grande protagonista é Hardy (Anna Hardy vem de Thomas Hardy) e a segunda é Emily (Emily Carter vem de Emily Brönte)
D.: Música favorita?
L.: Atualmente? Milion Reasons da Lady Gaga e já agora a trilha sonora de A Star is a Born.
D.: Filme ou série predileto?
L.: Hum… provavelmente O amor não tira férias. Embora seja viciada em Outlander. Podem escolher por mim.
D.: Momento favorito desta história?
L.: Ena, esta é difícil! (pensativa) A primeira vez que eles se conhecem? Se me perguntares amanhã, direi outra coisa (risos).
D.: Porquê título e personagens ingleses?
L.: Uma parte de mim é inglesa.
D.: Momento que mais trabalho te deu escrever?
L.: A tentativa de suicídio do Matt.
D.: Uma palavra que defina esta Parte I?
L.: Intensidade.
D.: Tens uma nova página em branco para começares a escrever uma nova história. Qual o género literário que podemos esperar?
L.: Romance.
Muito obrigado Lauren, foi tão bom conhecer-te desta forma. Espero que todos vocês tenham gostado desta entrevista, ao qual tentei fugir às perguntas típicas.
Poderão encontrar o livro da Lauren em pré-venda no site da editora sendo que os primeiros exemplares vão autografados! O livro sai oficialmente a 27 de fevereiro!
Adorei a entrevista! 🖤🖤
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Muito obrigado 🙂 Irei transmitir isso à autora!
Nas próximas semanas serão mais os autores a responder 🙂
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